sábado, abril 14, 2007

O inesperado


Poucas sensações são tão estranhas como quando nos sentimos observados. Pode ser só um pequeno desconforto, ligeiro sinal de paranóia, como quando espreitamos por cima do ombro na rua para verificar se alguém nos segue, embora ninguém se encontre atrás de nós. Pode ser o desconforto do aluno que transpira ao saber que o professor o percorre minuciosamente com o olhar à procura de cábulas escondidas, e logo ele que nesse dia não conseguiu evitar os auxiliares de memória...

Ou pode ser a surpresa total, a vinda a público dum segredo que queríamos esconder. Quando aquela rajada de vento a 120 km/h vem e nos arranca o capachinho à frente das nossas amigas. Elas que sempre pensaram que a nossa cabeleira era farta e o nosso penteado único...

O inesperado provoca reacções curiosas. Não há plano que valha numa tal situação. Da parte de quem observa e de quem é observado, a surpresa é um tubo de ensaio antropológico onde podemos observar a mais variada gama de tonalidades na paleta das emoções humanas.

Arrancam-nos os calções na praia e ficamos nus diante de toda a gente. Podemos corar de vergonha, ou simplesmente partir a cabeça ao engraçadinho que o fez. A reacção ao inesperado é, naturalmente, epidérmica.

Mas de todas as reacções, a mais pura, a mais divina, é o espanto. L'émerveillement, dizem os francófonos. Normalmente, exprime-se pelo "uau" e reflecte a percepção de uma ruptura na ordem das coisas. "Isto não é suposto acontecer", é o pensamento que paira latente, em pano de fundo, enquanto abrimos a boca de admiração. É o mais bonito e, por isso, o mais raro.

Mas nem tudo é inocente. Também epidérmico, mas mais distanciado, é o riso. Só o sábio e o louco sabem rir. O sério, esse, nem sempre consegue tomar a distância necessária para rir do acontecimento. O riso é a auto-confiança, a segurança de si face ao absurdo do acontecimento, ao inesperado. Revela inteligência e audácia. Em contextos sociais onde o decoro é apropriado, quando confrontado com a revelação do interdito, o espectador sorri, sim, mas moderadamente. Pode até, num gesto delicado, esconder ligeiramente o seu sorriso, mostrando distância, mas gozo.

E afinal de contas, quem é que nunca se sentiu observado, mesmo sem saber porquê?

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

ahah... o gonçalo tem capachinho ;)
por isso deves aderir ao taoismo e seu amor 'a natureza e 'a espontaneidade, na
comunhao com o planeta, com a galaxia e com a terra q pisas.. blabla * da ines a inesperada ;p

14/4/07 1:38 da tarde  

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